segunda-feira, maio 29, 2006

O elogio

Gostaria imenso de poder pelo menos dar-lhe um beijo, um beijo demorado e pronto. Achou a frase ingénua e elementar, mas gostou imenso. É impossível uma pessoa não gostar de uma frase onde se declara admiração por ela. É a lei do elogio, irresistível.

sexta-feira, maio 26, 2006

Elementar, meu caro

Escreveram-lhe nunca usando o "b", escrevendo tudo com"v". O "b" deve irradiar uma energia selvagem, pensou. Foi delicioso receber aquele email pejado de veijos e avraços.
Hoje sinto-me cruel.

É assim, simples

Não existe outra estratégia mais eficaz para seduzir uma mulher: falar, olhar, ouvir e fazer rir.

terça-feira, maio 23, 2006

O tom cruel da verdade

Às vezes não contava a verdade, mas a lembrança da verdade, que é uma mentira enorme, e que ela alterava a seu bel-prazer, para dar cabo dela, para se desfazer do peso do passado, do peso da realidade, que é tão inútil, tão irritante, tão insuportável. Às vezes era para desatar a rir, porém eram tristes as radiografias que fazia. E assim, o tom com que sempre contava a verdade, por vezes, era quase melancólico, mas entremeado de riso.

segunda-feira, maio 22, 2006

Tensão no estômago

Durante o dia as palavras amontoavam-se no crânio e lutavam para sair pela raiz nervosa dos dedos. E Maria, ao chegar a casa, copiava-as tal e qual, sem polir os arrebatamentos, sem lhes dourar as arestas, sem melhorar as cores, sem suavizar as margens ou modificar os traços. Da mesma maneira que iam saindo da sua boca os exageros, escrevia-os horas mais tarde, às vezes envergonhada de si própria, de pôr no papel coisas tão cruas como: apeteces-me por entre as minhas pregas macias e húmidas, as minhas coxas e a racha das minhas nádegas.

sexta-feira, maio 19, 2006

Em escuta



Audio:radiohead - sail to the moon.mp3
by LiquidDiamonds82

quinta-feira, maio 18, 2006

Escapadelas donjuanescas

"Deixa-me penetrar na tua linguagem."Deve estar convencido de que se pode conquistar alguém com frases de aparência poética. A frase é ridícula, não me encanto com monumentos de estúpida ambiguidade.
Repetiu "deixa-me penetrar na tua linguagem" e fiquei com a certeza de que com esta frasezinha tinha penetrado em mais de cem.

Compreender o Todo

Confuso não, abstruso. É um aprender que nunca se acaba de apreender. E fica só uma pequena visão, órfã, meia-morta, e simultaneamente complexada e altiva perante o resto.

Feel you

Will Downing, For All We Know
For all we know we may never meet again
Before you go make this moment sweet again
We won't say "Good night" until the last minute
I'll hold out my hand and my heart will be in it
For all we know this may only be a dream
We come and go like a ripple on a stream
So love me tonight; tomorrow was made for some
Tomorrow may never come for all we know
So love me tonight; tomorrow was made for some
Tomorrow may never come for all we know
(Words by Sam M. Lewis / Music by J. Fred Coots)

terça-feira, maio 16, 2006

Auto-retrato

Maria era uma exagerada, uma pessoa que sabia que só no exagero é que somos capazes de nos percebermos e para exagerar pintava abstractos. Não era pintora de paisagens bucólicas, com rio cristalino, colinas harmoniosas, vacas em claro-escuro, pastor na sesta e casinhas espelhadas na água. Também não gostava de fazer retratos tipo Renascimento, onde parece que é possível tocar a alma da personagem até nos botões do fato. Era rápida e pintava com pinceladas rápidas, sem polir, sem arrependimentos, deixando tudo ficar como saía ao primeiro traço.

segunda-feira, maio 15, 2006

As minhas alergias

Tiro a tampinha do inalador, um dos meus mais íntimos, fiéis e inseparáveis amores, o meu salvador quotidiano, em forma fálica, e após o segundo disparo, a ventilação pulmonar melhora em altas percentagens e os olhos deixam de chorar. Abençoo de mim para mim a química e a ciência médica. Com este bom pensamento e respirando com uma força e uma liberdade invejáveis, tenho a certeza que o próximo post a escrever será brilhante.

Existe a realidade trivial e depois existe o imaginário, que substitui o mundo imediato, mascara a realidade, dá-lhe um rosto melhor. É só uma teoria.
Mas porque será que me demoram mais os títulos que os posts?

O caminho da lógica

Começava a achar os sentimentos uma coisa ridícula. As pessoas, se conseguissem ser racionais, parariam de chorar nos enterros, de ficar emocionadas nos casamentos, de assistirem a baptizados e jogos de futebol. Ansiava ser como o doutor Spock, a personagem de uma série de televisão, que jamais tinha tido sentimentos diferentes da mera racionalidade. Nem se quer os mortos lhe inspirariam respeito ou compaixão, unicamente análise. O morto já não sente nada, pensou, portanto é inútil entristecer-se por causa dele; e os parentes, se choram por um morto indiferente ao seu choro, são ridículos, e se choram por si próprios, são parvos.
Orgulhosa do seu novo pensamento, decidiu deitar-se, despojada de paixões, suprimida de entusiasmo, rígida, prudente, ponderada à medida da razão.

sexta-feira, maio 12, 2006

Foi um amor rápido, de gatos

Foi assim que naquele sábado ficaram felizes às voltas na cama, perderam os sentidos, perderam-se felizes, riram-se mais tarde, também felizes, despediram-se felizes.

quinta-feira, maio 11, 2006

Confesso que

Incomodam-me as mães dos lactentes que, sem qualquer privacidade, abrem os recatados decotes, tiram os seus abundantes seios de ama, aquelas fontes simétricas de leite, aqueles mananciais, aqueles chafarizes, aqueles biberões de carne e zás, à frente de toda a gente. Pronto, está dito.

Fingidas atenções

Muitas vezes fingira um pouco mais de felicidade do que a que sentira.

Um blogue é...

Uma barreira de palavras contra a neurose.

Estas páginas cheias de riscos

De regresso ao vício, este segredo tão precioso e o mais íntimo que teve até hoje, esta melodia que se pode assobiar e decorar facilmente, este embalar, este visceral sentimento de amor/ódio que tem pela escrita e que se traduz neste blogue. De regresso ao blogue. Impossível desfazer-se dele, alojado que está, em regiões muito obscuras do seu ser. À memória veio-lhe a pergunta de uma amiga: Essa coisa que escreves e que nunca mostras a ninguém, para que serve? Desejou insultá-la. Achou-a coxa, incompleta, inconsciente por não ter um caderno de amoroso notário, pois apontar o amor tinha-a libertado das ideias fixas e do martelar incessante das obsessões.

quarta-feira, maio 10, 2006

Um segredo bem guardado

Não falava com as amigas de pormenores corporais. Não dos dele. Não contou. Nada contou. Falar com alguém, por exemplo, das mãos dele, ou do seu delta mais interessante, parecia-lhe como despi-lo e mostrá-lo à frente delas, e os seu próprios ciúmes impediam-na de fazer esse oferecimento, supor que outras mulheres pudessem sequer imaginá-lo, pensar nele, desejar esse objecto desenhado com palavras.

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