terça-feira, maio 15, 2007

1/2 comprimido para dormir


Que ninguém fale, nem um som. Quero do silêncio o quanto ele durar.

domingo, maio 13, 2007

Acordes maiores

Na sala da minha avó havia um piano. Um piano que se a humidade e o calor não dessem cabo, aguentava-se mais de seis meses afinado. Não é que a minha avó ainda tocasse, não, já não podia tocar quase nada, mas era capaz de notar, com o seu dedo indicador torto pela doença, nodoso como uma oliveira, se os intervalos de tons e semitons estavam bem ou se estavam já a desviar-se para um extremo ou outro da escala. Na sala já não existe o piano. Só uma fotografia da minha avó.

"Tiergarten"

As pequenas coisas. Sentiu-se parte dessa pequena casta que tem tempo para observar as pequenas coisas: o leite a levantar fervura; um carreiro de formigas desde a porta da varanda à porta do frigorífico, desaparecendo depois; contou um a um os azuleijos do chão, depois os da parede e ainda a quantidade de puxadores nos armários. Todos os elementos da sua cozinha com ela no centro. Não há nada mais difícil de ver do que aquilo que temos perto. Pequeno almoço e Rufus Wainwright. E entrou no seu espaço sentimental. Doesn't matter if it is raining. E choveu, na verdade choveu.

terça-feira, abril 10, 2007

"Quantos olhos tem uma alma"

Acredita, vim despedir-me de ti. Parto daqui a horas. Vou ficar só no que vir, sem ir além. Sabes como sou, nem uma fotografia. Percorri o apartamento todo e resolvi que o melhor sítio para ficar à espera da hora da partida era este. De vez em quando olho para o relógio, para ver as horas, mas os minutos não passam; é como se o tempo tivesse parado às 00h50, sempre às 00h50. Apaguei as luzes, torno-me menos vulnerável, menos fácil de descobrir. Eu volto. Afinal volto sempre.

terça-feira, março 27, 2007

1/2 comprimido para dormir

Tentativa de espancar tudo o que sai da minha cabeça.

A hipótese de seduzir alguém com quem ficar abraçada

quinta-feira, março 22, 2007

Sobre as viagens

Um dia levo-te a Nova Deli, pensei enquanto comia algo tailandês. Vou falar-te das pessoas que vi, das multidões, dos imensos pobres, do fumo, do lixo, das caras tão alegres ou angustiadas, dos meninos da rua, dos pedintes, dos vendedores de pastilha elástica. Um dia vou levar-te a conhecer a Velha Deli, a cheirar o caril, a ver as flores brancas, a seguir as ruas em pedra, a comer uma dosa ao pequeno almoço. Espero que chova. Alivia a humidade do corpo. Um dia levo-te a ver os templos sagrados, os rios contaminados, as caras sujas, os pés descalços e os trajes brancos. Ensino-te como se vestem os saris de seda e como se come com as mãos. Mas não desta vez. Desta vez ainda vou sozinha. Não consigo partilhar esta estranheza , o exótico que ainda esbarra em mim.

quinta-feira, março 08, 2007

1/2 comprimido para dormir

Não escreveu. Entregou-se com um misto de ternura e crueldade a um ofício que costuma pegar e abandonar: pintar. Nunca se separou dos quadros, amigos infatigáveis, íntimos ou de superfície, mas aos quais, de qualquer maneira continuava a sentir-se muito ligada. Olhá-los, limpar-lhes o pó e escondê-los é quase uma obsessão.

segunda-feira, março 05, 2007

Sobre a memória

Como um amplificador que se liga e se desliga, no quarto escuro da memória, aparecem durante segundos imagens. E é dessa matéria que somos feitos. De assentos e pormenores. Assuntos definidos, arrumados, quanto muito uma doce lembrança sem espaço, sem território nenhum. Vestígio esbatido, invasão territorial que, por algum mecanismo, se torna presente. Talvez hajam poucas coisas tão perigosas como a memória.

sexta-feira, março 02, 2007

"O primeiro passo"




O meu amigo André apresenta amanhã, na Fnac do Norte Shopping, um livro a partilhar.

Eu vou lá estar, às 19 horas, para lhe dar um beijinho e receber um autógrafo. Parece-me uma troca justa.


terça-feira, fevereiro 27, 2007

1/2 comprimido para dormir

Levantou-se, pousou o livro num lugar qualquer e arrastou-se até ao quarto. Fez um chá e pôs a música a tocar.
Boa noite.

3:40 sob o efeito da Lua

Há imenso verde, imenso azul, mas sobretudo muito cinzento. Quase denso. E algumas árvores. Altíssimas, velhíssimas, grossas como canoas, altas como precipícios e dão uma sombra de gigantes. Se não chove ouvem-se barulhos esquisitos, da aragem e de folhas que assobiam. Tudo é natural, material, terrivelmente material e vivo.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Solstício do Verão em pleno Inverno

domingo, fevereiro 25, 2007

Tudo sereno, tudo igual

Eis a ordem natural: Dois corpos que se querem e querem conhecer-se até ao fundo do corpo e da mente.

sábado, fevereiro 24, 2007

Éden perfeito

Eu vou todos os anos para o mesmo lugar, ou ía todos os anos, porque há algum tempo que não quero voltar. Não porque tenha deixado de gostar, mas sim porque da última vez gostei ainda mais.

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Quarta nota:

Fora de casa muito tempo. E o blogue é para se escrever de roupão e chávena de chá, vício caseiro, não em quartos de hotel. E não me interessa o tempo que passei fora e se ainda sei voltar. Às vezes, numa aterragem de emergência, sobre as árvores, as pessoas não morrem porque os ramos suavizam a queda e a humidade impede que se declare um incêndio.

Duas notas:

Este caderno fez dois anos de existência, passaram-me ao lado. Não fosse um leitor atento. Obrigada.
Deitei fora os teus sapatos. É que me irritavam, mais do que o da Cinderela.
E uma terceira não incluída no título e que me ocorreu agora: Chove. Caem aguaceiros como espessas e onduladas cortinas de água, e mais água e mais ainda. A única luz, intermitente, que ilumina o céu, as ruas e até as minhas próprias mãos, é a dos teus olhos. Dá-me vontade de rir, mas também de chorar.

Íntima confissão

Não queria contar, nem falar. No entanto, como esse não era ainda o dia assinalado para se despedir dele, faz um último esforço, para lhe contar alguma coisa. É como se tivesse perdido o dom de contar, já sem ansiedade, porque não se perduram vontades.
Vou mudar de assunto fazendo-te uma confissão. O que eu te disse não é verdade. Esta que sou eu, é a mesma. Com erros de apetite, indigestões. Foi como ficar doente com uma gripe, como ter engolido um peixe podre, mais nada. Tudo passa.


domingo, janeiro 07, 2007

Meia-noite em ponto

Um dia dou-te a pista, a possível chave secreta de tamanho interesse. É preciso explicar a teoria devagar. E não apeles à intuição popular. Essa conseguirá apenas fazer-te sorrir, mas não te permitirá compreender.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Sobre os ciúmes

Fosse como fosse, soube pelo tom de voz. Soube mesmo. Não podia dizer do que se tratava, que forma de alongar as vogais ou interromper as frases; talvez numa certa impaciência da respiração ou num escorregar da língua nos erres. Se calhar, nalguma incerteza do pensamento, numa espécie de intensidade diminuída da atenção, embora o mais provável é que o tenha notado nalguma coisa impossível de explicar racionalmente na sua consciência, mas que a parte animal que conservamos, essa remotra astúcia, lhe anunciava. Soube mesmo. Não há detective melhor do que um ciumento.

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