Caderno de apontamentos
Este é o caderno com os apontamentos das suas noites. Um caderno dividido em capítulos, em episódios, em estados de alma. Tinha-lhes atribuido uma ordem, tinha-os completado com notas à margem, com apontamentos adicionais apressados em frases alusivas e soltas, ía enchendo os espaços vazios de histórias, alheios de lembranças, órfãos de palavras, e ia-os completando até com mentiras, com exageros, com coisas inventadas.
Lê-os, lendo-se a si própria nas suas histórias, como hipnotizada, às vezes aterrada com as suas próprias palavras, tão rápidas, tão injustas, tão esquemáticas. O seu passado era aí uma terrível mentira, uma confusão, um desapontamento. Era ela, sem dúvida, mas não era ela. Reconhecia-se e não. Era um espelho opaco da sua vida.
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